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É do Brasil? Sucesso de Cangaço Novo levanta debate sobre propriedade patrimonial no streaming


A série Cangaço Novo, que figura na lista das mais vistas da plataforma Amazon Prime no Brasil e em países da África e do Oriente Médio, trata de um fenômeno exclusivamente brasileiro (seja o cangaço da primeira metade do século XX, seja sua manifestação contemporânea). Além disso, tem atores, diretores e roteiristas brasileiros e foi realizado por uma produtora brasileira.

 

Mas os oito episódios filmados na cidade de Cabaceiras, no Cariri paraibano, não têm Certificado de Produto Brasileiro (CPB) – como, de resto, nenhum dos títulos brasileiros produzidos diretamente para as plataformas de video on demand (VoD) exibidos até hoje.

 

A propriedade patrimonial desses produtos audiovisuais pertence às empresas estrangeiras de streaming, e não ao Brasil. No audiovisual, esse conceito refere-se à preservação e proteção dos direitos de propriedade patrimonial de obras cinematográficas.

 

Para que uma produção seja considerada brasileira, o CPB precisa ser requerido junto à Agência Nacional de Cinema, mediante envio de cópia da obra finalizada, por "pessoas físicas e jurídicas registradas na ANCINE como agentes econômicos".

 

Assim como a série Cangaço Novo, podemos citar outras produções feitas no Brasil e que a propriedade patrimonial está com as plataformas de streaming. São os casos das séries Sintonia e 3% sucessos da Netflix.

 

No início de setembro, 12 associações e sindicatos criaram a Frente da Indústria Brasileira do Audiovisual Independente (FIBRAv) para sensibilizar o Governo Federal, o Congresso Nacional e a sociedade a respeito dessa e outras questões ligadas à regulação do VoD no Brasil. Há dois projetos de lei em tramitação em Brasília, um na Câmara e outro no Senado, que tratam do assunto.

 

Além de mecanismos para garantir uma maior participação na propriedade patrimonial das obras para os produtores brasileiros que as produzem, a frente defende que parte do faturamento das plataformas no país seja revertida em obrigatoriedade de investimento direto na produção de conteúdos brasileiros independentes e de pagamento da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).

 

Propriedade patrimonial e regulação

Sem regulação do VoD no Brasil, o que acontece hoje é que a propriedade patrimonial das obras produzidas aqui fica quase sempre nas mãos de empresas internacionais.

 

Segundo o relatório "Recomendações acerca da Regulação do segmento de Video on Demand", divulgado em agosto pelo Ministério da Cultura (MinC), isso é prejudicial para a sustentabilidade econômica e cultural do setor, uma vez que promove a fuga de arrecadação do país e impede o fortalecimento da exportação de produtos culturais brasileiros.
 

Ainda de acordo com o MinC, diante desse quadro, é necessário buscar o equilíbrio considerando a liberdade contratual entre agentes privados, o respeito ao direito patrimonial das obras e o desenvolvimento da indústria audiovisual brasileira.

 

O relatório do ministério defende que "o marco regulatório do VoD deve assegurar que os direitos patrimoniais sobre a obra brasileira e, sobretudo, a obra brasileira independente, permaneçam majoritariamente com empresas independentes, em consonância com os normativos já consolidados no arcabouço regulatório do audiovisual. Essa premissa assegurará que a produtora, participe dos resultados financeiros (ou monetização) do sucesso de suas obras, e não atuarem como meros prestadores de serviço, sem participação no resultado de suas obras."

 

A dimensão do streaming no Brasil

A indústria audiovisual desempenha um papel fundamental na cultura e economia de um país. No Brasil, a indústria do audiovisual independente tem crescido significativamente, impulsionada por importantes conquistas regulatórias, a exemplo da Lei do Seac (nº 12.485), que fez com que o conteúdo brasileiro independente crescesse rapidamente de 3% para 18% na grade dos canais de TV por assinatura.

 

O exponencial interesse do brasileiro por plataformas como Netflix, Amazon Prime, HBO Max e Globoplay apontam para a necessidade de regulação desses players - sobre os quais não incide nenhum tipo de Condecine, ao contrário do que acontece com a exploração de obras audiovisuais em salas de cinema, TVs por assinatura e TVs abertas, entre outros mercados.

 

Segundo o Panorama do Mercado de Vídeo por Demanda no Brasil (Ancine, 2023), o Brasil lidera o ranking dos países da América Latina com maior número de plataformas (59, no total).
 

Apesar de ser um grande mercado consumidor, o país tem um número pouco expressivo de títulos nacionais no catálogo das principais plataformas de streaming.

 

O levantamento também mostra que a presença de conteúdos produzidos aqui é baixíssima nos serviços não-locais, girando em torno de 6% na Netflix e na Amazon Prime (já considerando filmes e séries de produção própria).

 

"Eu nem considero produções brasileiras, porque na verdade são de propriedade de empresas estrangeiras", diz Leonardo Edde, presidente do Sindicato da Indústria Audiovisual (SICAV), uma das 12 entidades que integram a FIBRAv. "Apesar de produzidas por empresas brasileiras, ter autores, elenco e equipe técnica e artística brasileiros, essas obras não são consideradas brasileiras porque os direitos intelectuais e patrimoniais pertencem às empresas estrangeiras".

 

Sobre a FIBRAv

A Frente da Indústria Brasileira do Audiovisual Independente (FIBRAv) reúne 12 associações e sindicatos do setor e tem como objetivo debater e contribuir para aprovação de uma regulação do streaming no Brasil que garanta espaço ao conteúdo nacional independente e fomente o desenvolvimento do setor. Fazem parte da mobilização as seguintes entidades: ABRACI (Associação Brasileira de Cineastas), ABRANIMA (Associação Brasileira de Empresas Produtoras de Animação), APACI (Associação Paulista de Cineastas), APAN (Associação de Profissionais do Audiovisual Negro), API (Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual Brasileiro), APRO (Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais), BRAVI (Brasil Audiovisual Independente), CONNE (Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste), FAMES (Fórum Audiovisual Minas Gerais, Espírito Santo e Sul), +MULHERES (Mulheres Lideranças do Audiovisual Brasileiro), SIAESP (Sindicato da Indústria Audiovisual do Estado de São Paulo) e SICAV (Sindicato Interestadual da Indústria Audiovisual).

É do Brasil? Sucesso de Cangaço Novo levanta debate sobre propriedade patrimonial no streaming É do Brasil? Sucesso de Cangaço Novo levanta debate sobre propriedade patrimonial no streaming Reviewed by Andre Guilherme on outubro 09, 2023 Rating: 5

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